A Justiça Federal em São Paulo determinou nesta segunda-feira, 7, que a Microsoft promova, em até 30 dias, adequações no sistema operacional Windows 10 para que o usuário possa, de forma simples e fácil, optar pelo não fornecimento de dados pessoais à empresa. A decisão liminar atende ao pedido do Ministério Público Federal. Atualmente, a opção padrão de instalação e atualização do software permite que a companhia obtenha diversas informações sobre os consumidores, sem o expresso consentimento deles.
Por outro lado, desativar a coleta de dados é tarefa complexa e trabalhosa, pois exige que o usuário personalize as configurações de cada serviço oferecido pelo sistema operacional.
Em abril, o MPF ajuizou ação contra a Microsoft, solicitando que a transferência de informações deixasse de ser feita de forma automática. O procedimento está previsto, sem alarde, no Termo de Licença do produto e na Política de Privacidade, dois documentos extensos normalmente não acessados pelos consumidores. Além de violar princípios constitucionais, como a proteção da intimidade, a empresa desrespeita direitos previstos no Marco Civil da Internet (Lei 12.965/14) e no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), por não apresentar de forma clara e destacada os detalhes sobre coleta, uso, armazenamento e tratamento de dados pessoais.
Decisão
Na concessão da liminar, a Justiça ressaltou a importância de a empresa adequar, de imediato, seus procedimentos à legislação brasileira, a qual preconiza a transparência, o fácil acesso e o fornecimento de informações claras e precisas. "Fato é que, tal como posto na inicial, sem dúvida alguma, os procedimentos para não habilitação ou desabilitação da coleta de dados, são, por vezes, de média/alta complexidade, o que, ao ver do Juízo, com base na experiência comum dos usuários de informática, dificulta, ou mesmo, impede que o usuário final tenha efetiva disponibilidade de não permitir o acesso aos seus dados. Por vezes, é mais fácil, do ponto de vista operacional, 'concordar' com os termos propostos (em que há a coleta de dados), do que ter que percorrer uma 'via crucis' no sentido de não autorizar tal acesso", diz a liminar.
A Microsoft deverá, em 30 dias, informar as adaptações que foram realizadas no sistema operacional, para que o consumidor, em caso de não consentir com o uso de seus dados, possa fazer esta opção com a mesma facilidade e simplicidade de quem autoriza o fornecimento de informações. A Justiça, contudo, entendeu que não seria possível exigir a readequação imediata de todas as licenças do Windows 10, a fim de que o software não mais colete informações de seus usuários. Segundo a decisão, no curso do processo deve ser feita perícia técnica específica, de forma a avaliar a viabilidade da medida, sem que haja comprometimento do serviço oferecido pela Microsoft. O MPF ainda está analisando a decisão para decidir se vai interpor recurso.
Coleta obrigatória
Autorizar o envio de informações é a opção padrão e mais simples de ser efetivada por quem deseja instalar o Windows 10. Sua desativação, por outro lado, é tarefa complexa e trabalhosa, pois exige que o usuário personalize as configurações de cada serviço oferecido pelo software. Além disso, a última atualização do sistema operacional tornou obrigatória a chamada "telemetria básica" nas versões domésticas, ou seja, mesmo que o consumidor desabilite a opção de fornecimento de dados, a Microsoft continuará coletando informações que considera essenciais para o desempenho do serviço, independentemente da vontade do usuário.
"Para além da busca de alegada manutenção da segurança do sistema, tal postura é indicadora de um objetivo mais amplo e relevante para os interesses comerciais da empresa, qual seja, potencializar ganhos e lucros com essa coleta invasiva de dados de seus consumidores", destaca o procurador Pedro Antônio de Oliveira Machado, autor da ação. Um exemplo deste uso é o identificador de anúncios (Advertising ID), serviço que os desenvolvedores de aplicativos podem conectar com as informações que o Windows 10 recebe diretamente do usuário.
Dados sigilosos
O procurador alerta ainda que inúmeros órgãos públicos da União utilizam o sistema operacional da Microsoft, entre eles a Justiça Eleitoral, Justiça Federal, diversos ministérios e o próprio MPF. Segundo a Secretaria de Tecnologia da Informação e Comunicação da instituição, é necessária uma análise constante por técnicos e analistas capacitados para evitar que atualizações do Windows 10 modifiquem as configurações e passem a permitir o envio de dados não controlados pelo MPF, o que colocaria em risco inclusive informações sigilosas e sensíveis, envolvendo investigações por todo o Brasil.
Além da empresa, a União também responde à ação devido à sua omissão na defesa dos consumidores. Os órgãos federais responsáveis pela proteção destes direitos deverão fiscalizar a implementação das adequações requeridas à Microsoft, aplicando as sanções administrativas cabíveis se necessário.
A ação civil pública, ajuizada pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão em São Paulo, requer ainda que a Microsoft pague multa de pelo menos R$ 10 milhões pelos danos morais já causados. Além da empresa, a União também responde à ação devido à sua omissão na defesa dos consumidores.