A gestão ágil de times no trabalho remoto e no modelo híbrido na pós-pandemia

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Os conceitos do mundo Ágil, por mais complexos e disruptivos que possam parecer, muitas vezes se confirmam espontaneamente, principalmente nas circunstâncias que exigem mais da capacidade humana. Segundo a Pesquisa Home Office 2020, da SAP e Sobratt (Sociedade Brasileira de Teletrabalho), apenas 23% dos funcionários deslocados são gerenciados por controle de ponto, enquanto 56% trabalham em função das entregas.

A adaptação das pessoas e das organizações a modelos de trabalho mais eficientes e objetivos, evidentemente, ainda é bem desigual. Segundo a pesquisa Work Trend Index (feita em janeiro deste ano pela Edelman Data x Intelligence com 31.092 home officers usuários do LinkedIn e Microsoft 365), 61% dos executivos dizem que aumentaram sua performance, o que cai a 38% entre os que têm menos autoridade para tomar as decisões.

O estudo global tem descobertas que convergem com dados locais da FGV, segundo os quais os funcionários veteranos se adaptaram mais facilmente ao home office. "São pessoas que leram livros, memorizaram informações e aprenderam a construir conhecimento de forma linear", justifica Veronique Donard, professora doutora da Unicap, especializada em ciberpsicologia. Em comentário sobre o Work Trend Index, Hannah McConnaughey, gerente da Microsoft, enfatiza o conhecimento dos processos, dos clientes e as conexões na organização. "É assustador para alguém em início de carreira criar networking com o trabalho totalmente remoto. Sem conversas no corredor, encontros casuais e papo durante o café, é difícil me sentir conectado até mesmo à minha equipe imediata, muito menos construir conexões significativas em toda a empresa", constata.

Ainda que se pense em modelos híbridos, o engajamento 100% digital tende a ser realidade para grande parte da força de trabalho. As publicações de empregos remotos no LinkedIn aumentaram mais de cinco vezes durante a pandemia. No Brasil, já vemos companhias aproveitando a consolidação do home office como forma de contratar nas regiões com boas universidades, onde não têm escritórios. Pelos dados do LinkedIn, 46% dos funcionários migrados para home office cogitam mudar de cidade. "É provável que essa mudança permaneça e seja boa para democratizar o acesso às oportunidades. As empresas nos centros econômicos podem contratar talentos de grupos sub-representados, sem os meios ou o desejo de se mudar para uma cidade grande. E em cidades menores, as empresas agora terão acesso a talentos que podem ter um conjunto de habilidades diferente do que tinham antes", pondera Karin Kimbrough, economista-chefe do LinkedIn.

A inovação pelas entregas e pelo exemplo, o novo papel da TI

Em meio a uma aceleração brusca das transformações, os líderes e os gestores de serviços têm se adaptado rapidamente. As respostas criadas pelas áreas de TI, cibersegurança, assim como de RH e gestão, mostram criatividade. E poucos estavam em um nível de maturidade ideal para os desafios. A TI não teve tempo de planejar as VPNs, controle de endpoints ou treinamento de usuários. Os líderes, gestores e profissionais de RH, por sua vez, também não contavam com mapeamentos precisos de skill, funções e outras capacidades nas equipes para trabalhar no novo cenário. Ainda assim, tomaram decisões em tempo real e, nesse aprendizado, mudaram paradigmas, que agora devem acelerar a transformação empresarial.

Os líderes e profissionais de desenvolvimento e serviços de TI, e outros tradicionais promotores de inovação nas organizações ganham atenção com o reconhecimento mais amplo dos benefícios da Transformação Ágil. Ao mesmo tempo em que cobram mais e mais entregas, todos olham as metodologias e ferramentas de gestão de projetos, gerenciamento de times e trabalho com equipes dinâmicas e distribuídas. O escritório híbrido é apenas um dos vetores da propensão a mudanças. Em uma das maiores organizações financeiras do país, por exemplo, as fintechs têm provocado todas as áreas de produtos a aprender a formar "vilas", "trilhas de valor" e outras versões internas dos jargões do Ágil.

Nos níveis estratégicos, o mundo que já era líquido fica cada vez mais volátil. Além das turbulências do cenário econômico, a Transformação Digital muda a lógica de ROI (retorno de investimento), janela de decisões e de valor. Em resumo, "escalar o Ágil" é alinhar a teoria da organização às práticas na organização, com paradigmas de gestão e governança que funcionem na nova economia.

Mesmo que sirva de referência a outras áreas, por uma combinação de skill e cultura, nada será como antes também para as equipes de inovação, tecnologia e desenvolvimento. Muitos times de DevOps, por exemplo, já são familiarizados com excelentes ferramentas para a esteira de desenvolvimento, enquanto as interações ocorriam em encontros presenciais ou espaços de coworking. Tentar fazer caber isso tudo em plataformas de comunicação fica longe de endereçar a Experiência do Usuário (UX) ideal para que cada um faça o que é relevante. E cria um pesadelo de governança. É óbvio que as ferramentas de conferência e mensagens são imprescindíveis. Mas devem funcionar como uma extensão da plataforma de trabalho, não o contrário.

Trabalho baseado em fatos – autonomia, criatividade e rumo

"O oposto de ser reativo não é proativo. É ser criativo", define Natalie Nixon, antropóloga e autora de The Creativity Leap: Unleash Curiosity, Improvisation, and Intuition at Work. "A pandemia causou uma explosão de criatividade e de potencial humano. Os engenheiros da indústria automotiva usaram scanners 3D e simulações computacionais para produzir respiradores em suas fábricas; os produtores de bebidas passaram a fazer álcool sanitário; e as costureiras trocaram os moldes para abastecer o mercado de máscaras e trajes médicos", exemplifica.

A crise sanitária trouxe dois desafios paralelos: fazer o que já tinha que ser feito; e fazer o que nunca foi feito. Além de manter a continuidade das operações, empresas de vários setores não podiam parar projetos como adequação à LGPD e outras iniciativas complexas e inadiáveis. Se já não é fácil manter a execução desses projetos em meio à reorganização do trabalho, mais desafiador ainda é lidar com demandas com escopo, recursos, prazos e objetivos em constante transformação.

A mudança brusca, que transformou "tendências" em fatos, não se restringe ao modelo de trabalho e colaboração interno. Na telemedicina, enquanto a TI dos hospitais escalava os acessos de dezenas a milhões, o regulador destravou as inovações. Empresas de comércio e serviços passaram a depender mais dos canais digitais, que por sua vez ganharam públicos mais amplos e diversificados. As demandas, expectativas e a própria permanência dos clientes, portanto, não se resolvem com contratos e projetos elaborados em contextos que não existem mais.

Para os protagonistas da Transformação Ágil, a conjuntura confirma dois de seus jargões: as necessidades prevalecem aos contratos; e dados são mais relevantes que opiniões e hierarquias (o que se acentua, quando nem os dados históricos dizem muito).
Os aspectos subjetivos também não são menos desafiadores nas organizações ágeis. O ser humano é o mesmo e neste momento todos compartilham incertezas. Isso muda o sentido da gestão de times. O product owner, por exemplo, precisa inovar seu mix de recursos de comunicação, design colaborativo e outras ferramentas. A clareza sobre a qualidade e experiência do cliente é hoje fundamental inclusive para o equilíbrio pessoal do colaborador. Os scrum masters ou agile coaches, por sua vez, passam a ter que atentar a questões como burn out.

A sustentabilidade do negócio, a transformação no trabalho e o bem-estar das pessoas são inquietações de quase todos, mas nem sempre interconectadas. Em termos mais ambiciosos, os gestores aprendem a inserir os aspectos pessoais nas atribuições de papéis e gestão de times. Todavia, só os conceitos básicos, praticados de forma genérica, já ajudam muito. Conseguir enxergar relevância, valor, ter feedback e objetivos acaba fazendo do trabalho uma parte dinâmica e positiva da vida.

Back office sem CEP

Embora as áreas de Software, em geral, tenham mais maturidade em modelos ágeis, o trabalho orientado às entregas, a gestão dinâmica de times e outras inovações já são familiares a profissionais de produtos, vendas, marketing e outras áreas tradicionalmente voltadas a projetos. As atividades de sustentação também tiveram que se transformar. Nesse sentido, um dos desafios enfrentados pelas áreas operacionais de muitas organizações tem sido profissionalizar as requisições e entregas de serviços.
Seja pela quarentena ou pela virtualização do escritório, a adoção ampla de ferramentas de Gestão de Serviços Empresariais (ESM), assim como a automação de processos, deve se aprofundar no "novo normal". Já vemos e podemos esperar usos criativos de recursos de IA e analytics.

Marcelo Lino, diretor de Vendas e Marketing LATAM na e-Core.

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