O governo está desconfortável com o relatório do relator do Marco Civil, Alessandro Molon (PT/RJ), que será colocado nesta terça, 10, em votação na comissão especial da Câmara que analisa o projeto. É bastante provável que a votação seja adiada, por iniciativa da própria base do governo. Basicamente, a posição fechada pelo governo na última sexta, 6, em reunião na Casa Civil com representantes de vários ministérios, é que estaria exagerado o poder atribuído pela proposta de Molon ao Comitê Gestor de Internet.
O Ministério das Comunicações e a Anatel chamaram a atenção dos demais ministérios para o fato de que o CGI estaria, com a redação dada ao artigo 9º do Marco Civil, assumindo uma espécie de papel regulador da Internet, sobretudo em questões referentes à neutralidade de rede, e a agência de telecom, ainda que competente para regular as redes, conforme estabelecido na Lei Geral de Telecomunicações, teria que se submeter às diretrizes do CGI.
O parágrafo primeiro do artigo 9º da proposta de substitutivo de Molon diz que "a discriminação ou degradação do tráfego respeitará as recomendações do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) e somente poderá decorrer de: I – requisitos técnicos indispensáveis à fruição adequada dos serviços e aplicações, e; II – priorização a serviços de emergência".
Para o governo, não haveria respaldo jurídico para essa atribuição. Para as operadoras de telecomunicações, esse item também preocupava, pois estabelecia uma outra entidade reguladora a ser obedecida. Vale lembrar que as teles também foram contrárias à escolha do CGI como responsável pela verificação da qualidade da banda larga.
Sobre a proposta de incluir o CGI como órgão definidor das diretrizes de neutralidade, o próprio relatório de Molon diz que é necessário reconhecer, "sem prejuízo da missão institucional dos Ministérios de Estado competentes e da Agência Nacional de Telecomunicações, o papel do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) na definição de diretrizes estratégicas relacionadas ao uso e desenvolvimento da Internet no Brasil e na recomendação de padrões técnicos e operacionais para a segurança das redes e serviços da Internet". Por isso, diz o relatório de Molon, foi proposta a explicitação do "papel indispensável do CGI.br na elaboração de recomendações para a adequada delimitação das hipóteses permitidas de discriminação e degradação de tráfego".
Segundo o deputado, a composição do órgão, que "inclui representantes do Governo Federal, do setor empresarial, do terceiro setor, da comunidade científica e tecnológica e um pesquisador de notório saber em assuntos de Internet, lhe garante uma visão balanceada, que por certo irá refletir em posições maduras e de grande representação da vontade geral na recomendação de regras relativas à gestão e neutralidade da rede no Brasil". Para as teles, contudo, isso não é verdade, já que o peso de cada um dos setores dentro do CGI não obedece necessariamente ao peso de cada setor no universo da Internet. Anatel e Minicom não entram na discussão sobre o modelo de governança do CGI, mas entendem que não cabe a ele definir diretrizes que se refletirão na regulação de telecomunicações.
Independente dessa posição das prestadoras, o governo tem ainda um desconforto jurídico com a ampliação do papel do CGI e acredita que esta discussão, assim como o debate sobre o conceito de neutralidade em si, ainda precisem ser melhor explorados, sobretudo no momento em que eles começarem a ser expressos em diretrizes e orientações que terão impacto em um setor regulado como é o de telecomunicações.