Apps: Cinco anos antes, vários à frente

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Quando Steve Jobs apresentou o primeiro iPhone, em 2007, fez questão de enfatizar que o sistema operacional do smartphone era o OS X e que o fato de tê-lo operando no celular proporcionava a criação de uma nova categoria de softwares móveis. Softwares, acrescentou ele à época, de mesmo nível daqueles que já eram usados em desktops (desktop class applications) e não os "baby softwares", como ele denominou os programas de seus concorrentes.

O CEO da Apple continuou a apresentação mostrando pela primeira vez alguns softwares nativos ao sistema que, nas palavras dele, "estavam pelo menos cinco anos à frente de qualquer outro aparelho".

O que pouca gente sabe é que Jobs não quis abrir imediatamente o sistema do iPhone para qualquer um desenvolver aplicativos. Para decepção de muitos desenvolvedores a situação se agravou ainda mais quando, no mesmo ano, foi apresentada pela Apple uma solução ideal (sweet solution) — rodar aplicativos web no Safari (web apps) para manter a segurança do sistema operacional. Isso claramente não era suficiente para os desenvolvedores. Eles queriam acesso real ao sistema operacional.

Depois de muita pressão da comunidade de desenvolvedores e do início de uma distribuição não oficial de aplicativos — por meio dos famosos jailbreaks —, a Apple foi praticamente forçada a apresentar o roadmap do sistema do iPhone e um kit de desenvolvimento (SDK) para a criação de aplicativos nativos por terceiros. O anúncio aconteceu em março de 2008.

Mas algo muito mais importante foi apresentado naquela data. A Apple mostrou pela primeira vez sua solução de distribuição oficial de aplicativos, a hoje conhecida App Store.

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Apresentação da App Store, em 2008

Cinco anos depois, o conceito de loja virtual de aplicativos revolucionou o mercado de software  como se conhecia até então. De repente, qualquer desenvolvedor — novato ou experiente, desconhecido ou já estabelecido — tinha a possibilidade de distribuir e atingir um número gigantesco de potenciais usuários.

Do ponto de vista dos usuários, de repente, surge uma forma segura, centralizada e organizada de encontrar qualquer aplicativo, tornando o processo de aquisição e download fácil e transparente para todos.

Não somente a forma de distribuição era nova, feita sem mídias físicas ou complicados processos de instalação, mas também era nova a forma de cobrar por este software. Aplicativos passaram a custar nada ou muito pouco — de US$ 2 a US$ 10 e, às vezes, só US$ 0,99 — e uma enorme quantidade de pessoas foi exposta a esses novos apps.

O modelo da App Store funcionou. Pouco tempo depois outras plataformas já estavam adotando o mesmo modelo. O Google adicionou o Google Apps Marketplace ao Android, que depois teve o nome mudado para Google Play. A Microsoft criou a Windows Phone Store e a RIM criou o BlackBerry App World. Além destas, muitas outras foram abertas e rapidamente fechadas, como a Ovi Store, da Nokia.

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Lojas de aplicativos mobile: App Store, Google Play Store, Microsoft Store e BlackBerry App World

A revolução das lojas de aplicativos não ficou restrita ao mundo dos consumidores finais. Grandes empresas também tiveram que mudar a forma de distribuir seus softwares, até mesmo internamente. À medida que funcionários começaram a trazer seus aparelhos para dentro das empresas — o famoso fenômeno do BYOD (bring your own device, ou traga seu próprio dispositivo) — muitas tiveram que repensar a forma de desenvolvimento e distribuição de seus próprios sistemas internos.

Paralelamente, novas empresas começaram a surgir e a fazer um enorme sucesso a partir do novo modelo. Empresas como Rovio (criadora do Angry Birds), Evernote, Foursquare, Instagram e muitas outras.

A ideia da loja de aplicativos se tornou tão natural que acabou migrando para o desktop. Tanto no sistema operacional OS X, da Apple, quanto no Windows 8, da Microsoft, foram apresentadas lojas integradas diretamente no sistema, facilitando, assim, a descoberta e aquisição de novos aplicativos.

No caso da Apple a mudança foi drástica. O seu próprio sistema operacional (OS X Lion) passou a ser distribuído pela Mac App Store, marcando assim o fim da era das mídias físicas para a empresa.

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Mac App Store. Marcou o final da distribuição de mídias físicas pela Apple.

Analisando somente o mercado de dispositivos móveis é fácil ver a grande dimensão deste modelo. Os números são impressionantes. Tanto na App Store quanto na Google Play Store são mais de 850 mil aplicativos publicados em cada uma. Recentemente, a Apple anunciou o incrível número de 50 bilhões de downloads de apps.

Quem está ganhando e quem está perdendo não é muito relevante neste contexto. Mas para quem quer acompanhar os números, um bom e recente artigo seria Who's Winning, iOS or Android? All the Numbers, All in One Place.

O que realmente importa é a revolução que a App Store proporcionou: a mudança no modelo de distribuição de software e a facilidade na experiência com o usuário final.

Obviamente ainda existem problemas pela frente. Apesar de todo o sucesso desse modelo, alguns efeitos recentes são visíveis. O primeiro decorre exatamente da enorme quantidade de aplicativos. Está ficando cada vez mais difícil descobrir novos apps interessantes nas lojas. Essa função fica a cargo das recomendações de pessoas, o que restringe a capacidade de novos desenvolvedores aparecerem no topo das listas — inclusive dentro das poucas categorias existentes nas lojas.

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Muitas plataformas e muitas questões para serem discutidas.

O segundo, e mais preocupante, se refere ao lucro real que esses aplicativos proporcionam aos desenvolvedores. Segundo uma pesquisa do Wall Street Journal, a maior parte dos lucros da App Store está concentrada numa parcela pequena de aplicativos (cerca de 80 deles) enquanto o restante dos desenvolvedores está recebendo relativamente muito pouco por suas criações, em parte também pela falta de exposição.

A App Store modificou o modelo de distribuição, mas com isso também mudou a forma de se cobrar por software. Será que este modelo é sustentável no longo prazo, já que a grande maioria não está ganhando o suficiente? Existem maneiras de melhorar esse cenário? São perguntas importantes que terão que de ser respondidas nos próximos anos.

No caso de aplicativos gratuitos, ainda não se decifrou um modelo rentável de apresentação de anúncios. Empresas como Google e Facebook estão testando todas as formas possíveis de monetizar esses apps na telas dos dispositivos móveis, mas ainda ninguém descobriu a fórmula ideal. Estas e muitas outras questões ainda serão exaustivamente discutidas e revisadas pelos gigantes da tecnologia e pela comunidade de desenvolvedores.

Cinco anos foram suficientes para mudar todo o cenário de uma indústria e criar uma nova economia.

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O que será que está por vir nos próximos cinco anos?

*Fabio Fiss é designer de interfaces e desenvolvedor de software, e trabalha há oito anos nas áreas digital e de internet.

2 COMENTÁRIOS

  1. Fiss, uma provocação para a nação de desenvolvedores – talvez no mercado de consumo, o real negócio do desenvolvedor não esteja apenas na programação e disponibilização de um app. Mas sim no serviço que o app oferece. Aquela velha discussão de "TI aplicada", a "computação ubíqua", a qual usamos a tecnologia sem perceber estar usando uma tecnologia. E, aqui, claro, estamos falando de inovação — essa palavra tão usada, para a qual não há receita de bolo. Para isso, o sistema de divulgação é relacionado ao negócio-serviço como um todo, não ao app em si. E por isso tão difícil… 🙂 parabéns pelo blog! Vou acompanhar.
    bjo.

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