O varejo brasileiro passou por um teste de fogo no início de 2022. A variante ômicron da covid-19 deixou empresas em alerta com uma possível terceira onda e, consequentemente, mais um período de suspensão das atividades comerciais presenciais. Ainda que a quantidade de infectados tenha realmente aumentado, observou-se um número reduzido de mortes e casos graves – fruto, principalmente, da campanha de vacinação no país, permitindo aos lojistas superarem esse momento sem terem que fechar as portas novamente.
Entretanto, esse foi apenas o primeiro obstáculo que vai aparecer ao setor até o fim de 2022. Trata-se, afinal, de um ano atípico, que mistura a imprevisibilidade das eleições no campo econômico com os conhecidos impactos de um evento como a Copa do Mundo de futebol e a retomada gradual de diversos indicadores. Mesmo diante de um cenário incerto, a análise de diferentes dados permite traçar um panorama dos desafios que irão surgir nos próximos meses para o varejo nacional. Confira:
1 – Inflação
Em 2021, o Brasil registrou inflação de 10,06% no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Foi o maior índice desde 2015. Entretanto, essa elevação foi decorrente de diferentes choques que o país encarou no ano passado, como crise hídrica no agronegócio, dificuldades no setor energético e problema nas cadeias – o que pressionou os preços em diferentes setores. Esses choques, porém, não são esperados para 2022, e a perspectiva é o indicador se arrefecer até o fim do ano. O Banco Central acredita que a inflação deva ficar em 7,1% neste ano.
2 – Variação cambial
No início de 2022, as incertezas da pandemia valorizavam o dólar perante as demais moedas – e o Real se depreciava ainda mais do que as outras por causa das incertezas fiscais no setor público brasileiro. Contudo, o conflito entre Rússia e Ucrânia provocou uma reação em cadeia na economia global, o que derrubou o preço do dólar ao longo das últimas semanas – recuo de 14% no primeiro trimestre de 2022. Quando se fala em câmbio, não existe dólar ruim. Se o valor elevado da moeda norte-americana era bom para quem exportava, a queda pode ser positiva para setores que dependem de importações.
3 – Taxa de juros
Com a inflação em alta, é natural que a Selic, taxa básica de juros, também subisse. Atualmente, ela está em 11,75%, mas há um ano estava em 2%. A tendência é continuar subindo ao longo de 2022 porque é a forma que o Banco Central usa para evitar o aumento de preços. Mas trata-se de um remédio amargo e com efeitos diferentes para diferentes setores. As áreas que dependem de crédito em circulação, como é o caso do varejo, vão sofrer mais, uma vez que haverá menos dinheiro "disponível" para compras.
4 – Emprego e renda
A inflação, sem dúvida, é a grande âncora que puxa a renda dos brasileiros para baixo no momento. Ela corrói o dinheiro e o poder de compra das famílias, contribuindo para a retração. Felizmente, observa-se que a oferta de emprego está evoluindo bem nos últimos meses, ainda que o salário oferecido esteja abaixo da média em muitos casos. Mesmo assim, há mais gente trabalhando e a massa salarial está positiva. Com a combinação de queda de inflação em 2022 com aumento de salário, esse cenário deve se inverter para os varejistas.
5 – O "super" último trimestre
Em outubro teremos eleição para definir o novo presidente, o que naturalmente faz com que diversos indicadores fiquem "sensíveis". Mas o último trimestre vai abrigar muita coisa, e o varejista precisa trabalhar direito os primeiros nove meses do ano para explorar ao máximo os últimos três. Para começar, em novembro temos a já tradicional campanha de Black Friday no varejo físico e digital. Para ajudar, entre novembro e dezembro, acontecerá a Copa do Mundo de futebol, que potencializa diversos segmentos, como venda de televisores, celulares, etc. Além disso, há as compras de fim de ano e a entrada do 13º salário.
Como se vê, é um ano realmente diferente. Mas isso não significa que é indecifrável. Pelo contrário, é possível entender paralelos com a análise acurada de dados. Com isso em mãos, é fácil identificar os diferentes efeitos em todos os mercados. Somente quando o varejista compreender isso, ele vai visualizar o timing adequado de cada decisão para alcançar os melhores resultados possíveis.
Bruno Rezende, CEO da 4intelligence.