Sandbox regulatório: a possibilidade das fintechs brincarem na praia

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A expressão sandbox significa "caixa de areia", sendo que a metáfora remete a uma criança brincando dentro de uma caixa de areia no parque ou na escola. A caixa de areia permite isolar um punhado da areia da praia, em um quadrado delimitado, para que a criança possa construir um castelo, usando sua imaginação, testando vários formatos de torres e entradas, de forma segura e sem que a força da água do mar o destrua. 

Na era da informação e da cibereconomia, testemunha-se um movimento global, em plena aceleração, de bancos e do sistema financeiro de criação de canais de experiência e relacionamento com clientes. Nesse contexto, cresce a cada dia o número de Fintechs brasileiras que se apoiam em plataformas digitais e remotas para prestar seus serviços, geralmente diferenciados em relação aos incumbentes.

Dado que as Fintechs passaram de coadjuvantes a protagonistas no novo ecossistema financeiro brasileiro, e que o sistema financeiro nacional não possui regulamentação que se encaixe às Fintechs, surge a necessidade de regulação adequada para um novo sistema financeiro virtual, ainda em formação. 

No dia 13 de junho de 2019 o Ministério da Economia, o Banco Central (BACEN) e a Superintendência de Seguros Privados (Susep) assinaram comunicado conjunto em que tornaram pública a intenção de implementar um modelo de sandbox regulatório ("Bancos de Testes Regulatórios") para as Fintechs no Brasil.

O sandbox regulatório permitirá às Fintechs operarem por prazo determinado, com número reduzido de clientes e em condições determinadas pelo órgão supervisor. Durante o período do sandbox o regulador acompanhará a Fintech e no final do prazo terá elementos para decidir se a regulamentação existente é adequada ou se há a necessidade de criar regulamentação específica.

Considerando suas diferentes esferas de competência, os reguladores terão o desafio de agir de forma coordenada, com flexibilidade, dentro dos limites permitidos pela legislação brasileira, de modo a realizar adaptações que viabilizem operações inovadoras e, ao mesmo tempo, garantam a proteção e segurança jurídica nas relações.

Diversos países implementaram ou estão em fase de implementação do sandbox regulatório, sendo Reino Unido e Singapura aqueles de maior destaque. O Reino Unido opera com dois períodos de teste de seis meses por ano e para participar do sandbox as empresas interessadas devem enviar um formulário à autoridade responsável descrevendo como elas atendem aos critérios de elegibilidade para testes. As empresas que forem selecionadas recebem um responsável pelo caso, que é especialista em regulamentação. O contato próximo com os especialistas em regulamentação permite que as empresas entendam como seus modelos de negócios inovadores se encaixam no marco regulatório, e, ainda, assegura que salvaguardas apropriadas sejam incorporadas em produtos e serviços inovadores durante e após o teste. Em Singapura as empresas interessadas em participar do sandbox devem comprovar que seus produtos e serviços são inéditos e trazem benefícios para os consumidores. Assim como, definiram diferentes cenários e resultados possíveis, dispõem de procedimentos para atenuar riscos e criarem mecanismos de transição e saída. Durante o sandbox o regulador pode flexibilizar requisitos legais como referentes a custódia de ativos, composição do órgão de administração, fundos de liquidez e exigência de capital. Mas em todos os casos de sandbox, não há flexibilização para normas que afetam os riscos dos consumidores, tais como diligência, honestidade e integridade das entidades, confidencialidade das informações, dentre outras.

Para que o sandbox regulatório brasileiro seja bem-sucedido, destaco como principais requisitos e diretrizes: (i) definição clara das condições e limites do sandbox; (ii) admissão de Fintechs que comprovem produtos ou serviços inéditos; (iii) criação de mecanismos de mitigação de riscos e testes sobre os impactos das atividades; (iv) estabelecimento de prazo determinado, incluindo mecanismos de transição e saída do sandbox e (v) priorização na aplicação de regras autorregulatórias, baseadas em princípios.

O comunicado conjunto do Ministério da Economia, BACEN e Susep é uma boa notícia para as Fintechs. A torcida é para que muitos castelos de areia sejam construídos e no final não sejam levados pela força do mar. Acompanhemos os próximos passos.

Dulce Artese, advogada da Viseu Advogados.

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