Passado o impacto inicial das denúncias feitas pelo ex-colaborador da Agência de Segurança Nacional (NSA) dos Estados Unidos, Edward Snowden, que vazou para a imprensa milhares de documentos sobre o vasto programa de espionagem do governo americano, desencadeando um escândalo internacional, as empresas de tecnologia do país agora contabilizam o prejuízo.
A Microsoft, por exemplo, perdeu vários clientes, inclusive o governo do Brasil, e a IBM está gastando mais de US$ 1 bilhão para construir data centers no exterior para tranquilizar os clientes estrangeiros que suas informações estão a salvo dos olhares indiscretos no governo dos EUA.
As perdas provocadas pela espionagem da NSA foram tema, inclusive, de uma longa reportagem publicada nesta sexta-feira, 21, pelo New York Times. O jornal americano procura mostrar o tamanho do estrago causado aos negócios das empresas com base em entrevistas com seus executivos e analistas da indústria de TI.
Um dos efeitos imediatos das denúncias de Snowden, segundo o jornal, foi a corrida de clientes para empresas de tecnologia no exterior, da Europa à América do Sul, se distanciando de fornecedores dos EUA, muitos deles suspeitos de colaborar deliberadamente com o programa de vigilância da NSA.
De acordo com o texto, apesar de Washington estar enfrentando conseqüências políticas e diplomáticas em razão dos vazamentos feitos por Snowden, as empresas dizem que o prejuízo econômico é expressivo. Este, por sinal, será o tema da reunião, programada para esta sexta-feira, que executivos de tecnologia, entre eles Eric Schmidt, do Google, e Mark Zuckerberg, do Facebook, terão na Casa Branca com o presidente Barack Obama.
Perdas bilionárias
Segundo analistas ouvidos pelo periódico, ainda não é possível verificar a extensão dos danos econômicos decorrentes da espionagem porque para a maioria das empresas os contratos plurianuais ainda estão em plena vigência. Mas eles não têm dúvida de que as empresas estrangeiras estão questionando a confiabilidade de produtos e tecnologias norte-americanas.
Muitos observam que, embora as empresas de tecnologia afirmem veementemente que não fornecem informações sobre os seus clientes ao governo, exceto quando exigidas por lei, a percepção é que o programa de espionagem tem permanecido.
"É claro que cada empresa de tecnologia é única e que isso está afetando o resultado final delas", disse Daniel Castro, analista sênior da Information Technology & Innovation Foundation, o qual estima que a indústria de computação em nuvem nos EUA poderá perder US$ 35 bilhões até 2016.
A empresa de pesquisas na área de tecnologia Forrester Research vai além e calcula que as perdas podem chegar a mais de US$ 41 bilhões, ou 25% da receita da indústria, com base no tamanho das empresas de cloud computing, web hosting e de outsourcing.
O efeito negativo das denúncias de espionagem da NSA para os negócios é sentido mais nas conversas diárias entre as empresas de tecnologia. O tema sobre a vigilância americana, que raramente era tratado antes, agora é "normal" nessas conversas, conforme disse um executivo de empresa de tecnologia, que pediu anonimato.
"Estamos ouvindo de clientes, especialmente clientes corporativos globais, que se importam mais do que nunca sobre o local onde o seu conteúdo é armazenado e como ele é usado e protegido", disse John E. Frank, advogado-geral adjunto da Microsoft. Segundo ele, para afastar qualquer receio, a empresa tem divulgado que os clientes podem escolher armazenar seus dados em data centers da Microsoft em vários países.
Fora das solicitações de propostas
Embora diga que é difícil quantificar as oportunidades perdidas, James Staten, analista de computação em nuvem da Forrester, observa que as empresas de tecnologia americanas estão sendo deixadas de fora de algumas solicitações de propostas (RFPs, na sigla em inglês) de clientes estrangeiros. Este é caso, segundo ele, de empresas alemãs, que explicitamente não convidam certas companhias americanas para participar de suas RFPs. Ele acrescenta: "É como dizer, 'bem, o melhor fornecedor para fazer isso é a IBM' e você não convidá-la".
Outro exemplo é do Brasil e a União Europeia, que usavam cabos submarinos americanos para comunicação intercontinental, e deciciram, no mês passado, construir seus próprios cabos entre o Brasil e Portugal, contemplando com contratos empresas brasileiras e espanholas. O governo brasileiro também anunciou planos de abandonar o Microsoft Outlook como seu sistema de e-mail.
Analistas de segurança dizem que um exemplo de conseqüência das revelações de Snowden é o que aconteceu com a Huawei, fabricante chinesa de equipamentos de rede de telecomunicações, que foi impedida de participar de concorrências do governo americano, depois que legisladores afirmaram que os produtos da empresa continham uma backdoor (também conhecida com porta dos fundos), que permite acesso ilimitado a todos os dispositivos de rede e, consequentemente, às informações que nela trafegam. Esta afirmação, contudo, nunca foi confirmada. Para esses analistas, não seria surpresa se o mesmo fosse adotado por outros países em relação a empresas americanas.