Ainda podemos ter esperança na LGPD para 2024?

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A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), promulgada em 2018,  entrou em vigor em 2020, e foi criada com o  intuito de proteger os direitos dos cidadãos em relação ao uso de seus dados pessoais. Mas, assim como acontece com outras leis em nosso país, percebo indignado que a LGPD parece ser aplicada pelas organizações mais como uma medida defensiva contra possíveis ações judiciais do que pelo compromisso verdadeiro com a privacidade e a proteção dos dados.

Essa abordagem defensiva pode ser resultado de diversos fatores, como a falta de compreensão plena dos objetivos da lei, o medo de penalidades significativas em caso de não conformidade, ou até mesmo em função da cultura organizacional que prioriza a proteção jurídica em detrimento do compromisso ético com os clientes, funcionários, parceiros ou fornecedores.

A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão responsável pela fiscalização e aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no Brasil, tem um papel fundamental na orientação, regulação e aplicação da lei. A estratégia adotada pelo órgão, contudo, ainda parece privilegiar uma abordagem mais passiva no que se refere à fiscalização e à aplicação de penalidades.

Tal perspectiva pode ser estratégica no início da implementação de uma nova legislação, quando o foco é dado mais na orientação e na adequação das organizações à lei. Educar e criar cultura são, sim, importantes, mas essas estratégias serão em vão se o real propósito da LGPD não for absolutamente compreendido.

Não à toa, a postura do órgão fiscalizador tem gerado um efeito colateral: a judicialização imediata das demandas. Ou seja, como a sociedade não percebe as ações punitivas contra os abusos que continuam a acontecer, aqueles que têm condições acionam a justiça. Em resposta, ao invés de as organizações cumprirem a legislação, adotando as medidas técnicas e administrativas necessárias, elas acabam dando ênfase ao arcabouço jurídico de defesa e proteção contra as eventuais demandas judiciais, deixando um pouco de lado a gestão e minimização dos riscos de violação e uso indevido dos dados pessoais.

Ironicamente, um dos pontos mais fortes trazidos pela LGPD é justamente exigir que as organizações minimizem os riscos que suas operações trazem ao titular quando tratam seus dados pessoais. Algumas empresas, inclusive, passaram a buscar somente apólices de seguro  para cobrir eventuais prejuízos com incidentes de violação, mas essa não é a conduta adequada.

O seguro cobre prejuízos e pode ser parte da solução, mas não faz a empresa cumprir a legislação. Até porque as próprias seguradoras não farão o seguro para empresas que não gerenciam riscos adequadamente.

A legislação propõe mudanças nos processos e nas medidas de segurança da informação para garantir que os dados pessoais sejam tratados com o menor risco possível para os titulares. Daí a importância de respeitar o modelo regulatório, com seus princípios e direitos.

Diante deste cenário, a LGPD vem se transformando em um instrumento de defesa dos direitos das empresas, quando, na realidade, deveria ser uma aliada das organizações para cuidar dos dados pessoais de seus envolvidos, protegendo o cidadão contra violações e usos indevidos. Este sim o objetivo da lei.

Em 2024, para que se mude essa perspectiva, entendo que deva ser feito um esforço conjunto, tanto do governo, para garantir que a lei seja interpretada e aplicada de maneira correta e eficaz, quanto das próprias organizações, que precisam internalizar o respeito à privacidade como um valor central, e não apenas como uma obrigação legal. Além disso, é fundamental a conscientização e educação contínua sobre os direitos dos titulares dos dados e sobre a importância da proteção  e privacidade destes em todos os níveis da sociedade.

Enio Klein, influenciador e especialista em vendas, experiência do cliente e ambientes colaborativos com foco na melhoria do desempenho das empresas a partir do trabalho em equipe e colaboração. CEO da Doxa Advisers e professor de Pós-Graduação.

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