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Blockchain: panorama e perspectivas

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Vivemos em um mundo onde cada vez mais interagimos cotidianamente como cidadãos, consumidores e colaboradores através de ambientes digitais. Quase que inevitavelmente, uma parte maior ou menor de nossas vidas, nos diferentes papéis que desempenhamos, está atrelada a transmissão de informações por estes meios, em especial, a Internet.

Em praticamente todas as interações que estabelecemos online são gerados dados diversos sobre quem somos, tanto pessoal quanto profissionalmente, tais como, preferências hábitos, locais que frequentamos, grupos profissionais que seguimos, bancos que utilizamos, histórico de compras, personalidades públicas que nos interessam, dentre outros.

Nos contextos de compra e venda de produtos e serviços, assim como operações financeiras diversas, tais interações devem ser necessariamente validadas por alguma autoridade ou entidade autorizada para tal, como bancos, empresas de cartão de crédito e pagamentos, instituições governamentais, entre outras. A presença de uma entidade validadora que confere confiabilidade às trocas realizadas online é uma característica da economia digital em seu estado atual. De fato, não se trata apenas de relações comerciais e financeiras, mas também simples operações como um provedor de serviços de e-mail nos dizendo que uma mensagem foi entregue, uma autoridade de certificação confirmando que determinado certificado digital é confiável, ou mesmo uma rede social como Facebook confirmando que nossos posts foram compartilhados apenas com nossos amigos.

Apesar de muitas vezes nos esquecermos, o fato é que realizamos uma série de trocas, financeiras ou não, no ambiente digital confiando em uma terceira entidade que garanta nossa segurança e privacidade. Trata-se na verdade de um equilíbrio mais tênue do que imaginamos ou queremos efetivamente perceber.

Conceito

A tecnologia de Blockchain se propõe a ser uma solução definitiva para que possamos realizar com segurança e confiança uma série de atividades online nos mais diversos contextos. Trata-se de uma forma de registrar e validar as operações que ocorrem digitalmente de forma segura e transparente. Na prática, seria como se cada operação carregasse consigo um livro-razão público, armazenado e validado por uma rede distribuída de computadores.

As informações gravadas neste livro não podem ser alteradas ou apagadas, permanecendo como um registro perene, que pode ser a venda de um ativo, a assinatura de um contrato, uma transferência financeira, uma sequência de códigos genéticos (como abordaremos mais adiante neste texto), entre outras. Esses registros podem ser verificados a qualquer momento sem que a privacidade do conteúdo (contrato, ativos, dados de uma transação, etc.) e das partes envolvidas seja violada.

A título de recuperarmos o conceito de livro razão, cumpre comentar que se trata de um registro baseado no método contábil de partidas dobradas. Este livro contém informações acerca da data da transação, a quantidade de bens e/ou valores transacionados, o saldo anterior, o valor do débito e do crédito, o saldo final e a natureza da transação (crédito ou débito). Em outros termos, o livro razão se presta a registrar todas as informações que dizem respeito aos envolvidos em uma operação, a data das alterações e sua natureza.

Com a tecnologia de blockchain cada operação é digitalmente assinada com o objetivo de garantir sua autenticidade, privacidade e inalterabilidade. Os novos registros são validados por uma infraestrutura de computadores e servidores, chamados de nós. Após esta validação são integrados ao bloco de informações sobre aquela operação (um histórico, tal qual um livro razão). Os blocos de informação podem ser verificados a qualquer momento, pois cada nó possui cópias dos registros autenticados. Uma das tecnologias que viabilizam a blockchain é a já conhecida criptografia, juntamente com o conceito de banco de dados distribuído e o consenso, que ocorre mediante as checagens realizadas pelos nós da rede.

Quando uma nova operação é realizada, por exemplo, um contrato recebe uma nova assinatura ou tem uma de suas cláusulas alterada, parte dos nós de uma implementação de blockchain executa uma série de algoritmos e, basicamente, avalia e verifica o histórico do bloco de informações ao qual a operação se refere (nesse caso, um bloco de informações sobre aquele contrato), as identidades envolvidas e a integridade, autenticidade e validade do conteúdo, chegando assim ao consenso de que histórico e assinatura são válidos. Após essa verificação é dada a permissão para que a nova operação seja aceita e adicionada como um novo bloco à cadeia de informações referentes àquela operação (nesse exemplo, todas as informações referentes ao contrato, desde a sua primeira versão para assinatura). Caso qualquer um dos nós da rede envolvidos na verificação não reconheça a operação devido a alguma divergência ou inconsistência, tal registro (os dados da operação realizada) é negado e não é adicionado à cadeia de informações (ou seja, a sequência de blocos de registros, daí o termo “blockchain”).

O modelo de consenso permite que a blockchain funcione como uma rede de autenticação distribuída, o que resulta na independência de uma autoridade central para informar quais operações são válidas ou não, já que a própria rede é responsável por esta verificação e autenticação.

A independência de uma autoridade central para autenticação elimina a necessidade de câmaras de compensação, cartórios, bancos e outros agentes que têm como função validar e autenticar operações de diversos tipos. Dessa forma, permite redução de custos e maior velocidade na realização, verificação, definição e registro de operações. A assinatura e verificação digital por consenso é uma alternativa eficaz para a redução de fraudes e outras práticas criminosas que ocorrem atualmente no meio digital e físico.

Aplicações

A tecnologia de blockchain será crítica para fornecer identificação sobre fraudadores, equipamentos utilizados para essas práticas, transações escusas e outros aspectos ilegais que são combatidos por políticas de AML (“Anti-Money Laundering”) e EFM (“Enterprise Fraud Management”). Presenciaremos no Brasil a adoção da tecnologia de Blockchain para o cumprimento dessas políticas tanto pelo setor privado quanto público nos próximos anos.

A tecnologia de blockchain é ainda conhecida pela maior parte das pessoas quase que exclusivamente pelo suporte à criptomoeda Bitcoin. A “Bitcoin Blockchain” gerencia cerca de 200 mil transações diárias ou USD 150 milhões globalmente, sem a necessidade de intermediários financeiros. Fazendo uma analogia, podemos dizer que Bitcoin está para Blockchain assim como um aplicativo está para um iPhone ou Android. Em outros termos, blockchain é a tecnologia que viabiliza a existência e transações com Bitcoins. O fato é que ela pode suportar uma série de aplicações que vão muito além das criptomoedas.

É interessante notar como o desenvolvimento de uma tecnologia que foi criada para dar suporte às criptomoedas resultou em algo que superará em muito os benefícios inicialmente esperados – inclusive aqueles relacionados com as próprias criptomoedas. Blockchain vem se consolidando como uma das tecnologias que gerará nos próximos anos enorme valor para diferentes setores como saúde, entretenimento, comércio, imobiliário, indústria, governamental, entre outros.

No contexto das cidades inteligentes (“Smart Cities”), algumas aplicações que vêm sendo desenvolvidas com a tecnologia de blockchain incluem o armazenamento transparente de arquivos públicos, processos de votação, gestão inteligente de contratos, distribuição de verbas públicas, e decisões distribuídas e participativas que envolvem uma maior interação população-governo. Podemos mencionar nesse sentido alguns exemplos como o projeto do estado de Delaware (EUA), para o arquivamento de informações públicas, e a proposta da prefeitura de Londres, para a implementação da “Mayorchain” visando o aumento da transparência do orçamento da prefeitura e crowdsourcing de ideias para a redução de custos de gestão. Ainda no Reino Unido, o governo federal está executando um projeto piloto para que os pagamentos de pensões à população sejam realizados através de uma rede blockchain com ganhos contundentes de velocidade em relação ao sistema atual.

A tecnologia de blockchain tem o potencial de transformar, tornar mais ágil, seguro e menos custosas as trocas financeiras, a gestão de negócios, manutenção de registros médicos, votações, dentre outras inúmeras aplicações. As economias com processos de controle e validação que hoje exigem a manutenção de recursos humanos específicos serão significativas conforme a blockchain se torna mais difundida.

Uma das aplicações que vem recebendo mais investimentos no contexto da tecnologia blockchain trata sobre os contratos inteligentes, que são basicamente programas que podem traduzir e executar automaticamente os termos de um contrato. Quando uma condição pré-configurada em um “smart contract” é atendida os termos do acordo podem ser executados automaticamente de forma transparente e supervisionada pelos nós da rede blockchain. Por exemplo, poderá ser realizado um pagamento mediante data prevista em contrato ou a autorização para o envio de um produto.

As identidades das partes de um contrato inteligente podem ser mantidas em completo sigilo se assim for acordado entre elas. O mesmo se aplica quanto ao seu conteúdo que pode permanecer aberto para os participantes de uma rede blockchain, por exemplo, para análise e monitoramento do mercado de determinado produto ou serviço, objetos do contrato.

Para ilustrar a diversidade de aplicações da tecnologia de blockchain e o espectro de benefícios que podem ser extraídos nesse sentido vale mencionar o projeto que vem sendo desenvolvido pelo Amazon Bank of Codes (uma criação do Earth Bank of Codes), o Earth BioGenome Project e World Economic Forum, que tem como objetivo mapear os genomas de inúmeras espécies de plantas e animais originários da floresta amazônica. Este grande Big Data de informações genéticas armazenado de forma distribuída em uma rede blockchain ficará acessível para o uso comercial e científico, garantindo que todos os ganhos econômicos gerados com componentes formados a partir de seus dados sejam também revertidos para os países de onde os ativos biológicos são originários, dentre eles o Brasil.

O protocolo de Nagoya de 2010 vem tentando endereçar a questão da identificação da origem desses ativos de modo a beneficiar os países de onde os mesmos foram extraídos, porém trata-se de um processo complexo para o qual há uma série de barreiras, inclusive políticas. A tecnologia de blockchain poderá ser a solução definitiva para a questão. Será atribuída uma identidade digital inalterável a todos os dados biológicos que será monitorada e armazenada pelos nós da rede. Todas as vezes que esses dados forem utilizados os novos registros, após serem autenticados e validados, passarão a integrar o banco de dados distribuído. Dessa forma os benefícios poderão ser revertidos para os países de acordo com a origem de cada ativo.

Além de beneficiar os países de origem, o maior benefício desta rede baseada na tecnologia de blockchain é permitir que o conhecimento seja extraído da floresta e não mais exemplares das próprias espécies. Em outros termos, o mapeamento das sequencias genéticas permitirá a realização de pesquisas e a utilização comercial dos elementos da floresta sem que animais e plantas precisem ser extraídos in loco. Elementos originários da floresta poderão integrar produtos diversos enquanto suas fontes de origem são preservadas.

Potencial Disruptivo

O potencial disruptivo da tecnologia de blockchain é comparável, para muitos, ao que foi a Internet na segunda metade da década de 90. Trata-se potencialmente de uma tecnologia que mudará o estilo de vida da maioria da população mundial nos próximos 10 anos. Algumas previsões apontam para 10% do PIB mundial sendo transacionado com o suporte da blockchain.
Segundo o World Economic Forum (WEF), a tecnologia de blockchain já mobilizou, desde o seu surgimento, mais de 2.500 pedidos de patentes e cerca de US$ 1,4 bilhão em investimentos.
Blockchain tem o potencial de mudar a forma como percebemos, pensamos e utilizamos a Internet, ao mesmo tempo, trazendo também um retorno às origens da rede mundial, ou seja, um sistema descentralizado e igualitário. O que o grupo que adotou o pseudônimo Satoshi Nakamoto apresentou ao mundo em 2008 foi muito além de uma tecnologia que suportaria uma criptomoeda. De fato, se trata de uma nova forma de estabelecer um consenso sobre o conteúdo de um banco de dados sem que ninguém esteja em seu comando. Ao mesmo tempo, surgiu também uma forma de compensar as pessoas por ajudar a tornar esse banco de dados viável e cada vez mais confiável, uma vez que elas podem decidir fazer parte da rede disponibilizando seus recursos computacionais para que se tornem nós validadores das operações, tendo a possibilidade de serem compensadas de diferentes formas. Por exemplo, com unidades da moeda como ocorre no caso da “Bitcoin Blockchain”.

Essas duas ideias vêm sendo replicadas em dezenas de novos sistemas inspirados pelo Bitcoin. Um desses sistemas é o Ethereum projetado para ser uma rede blockchain que suportará uma grande diversidade de aplicações. Atualmente existem centenas de aplicativos Ethereum em desenvolvimento, desde clones do Facebook até serviços de crowdfunding.
Implementação

Diante de uma série de projetos com escopos abrangentes, como os que citamos anteriormente, empreendidos por exemplo por prefeituras, governos estaduais, entre outras instituições, é importante não se deixar intimidar e compreender que estamos tratando de uma tecnologia baseada em código aberto, portanto, acessível a todos desde que os requisitos de conhecimento para sua utilização sejam atendidos.

É razoável e sensato, para a maioria das empresas e instituições públicas, iniciarem suas incursões no mundo das blockchains com projetos-piloto de escopo reduzido. Nesse sentido, é importante mapear a necessidade de recursos computacionais que o projeto exigirá, possíveis entraves burocráticos, os benefícios esperados com a aplicação, e os requisitos de conhecimentos para sua execução. Alguns conhecimentos que fazem parte da construção da maioria das aplicações de blockchain são GitHub, Node JS, virtualização, JavaScript, JSON e Golang, além de experiência em arquitetura de rede, criptografia e conexão P2P.

Nos próximos anos observaremos a utilização de dois tipos de redes de blockchain: públicas e privadas. Veremos empresas tomarem a decisão de adotarem redes privadas abrangendo subsidiárias, filiais, parceiros de negócios e clientes. O mesmo deverá ocorrer com a administração pública que construirá redes de blockchain integrando contribuintes, órgãos de diferentes instâncias e atribuições, e seus fornecedores.

Por sua vez, as redes públicas de blockchain serão largamente utilizadas para uma série de aplicações como registros de direitos autorais, compra e venda de produtos, votações, entre muitas outras.

A diferença entre as blockchains públicas e privadas está somente em quem poderá fazer parte de cada uma das redes.

No caso das redes públicas de blockchain qualquer pessoa ou instituição pode participar. Veremos que em muitos casos haverá algum tipo de incentivo para que diferentes agentes participem da rede, como ocorre atualmente com a “Bitcoin Blockchain”. Uma das desvantagens deste tipo de blockchain é a quantidade de recursos computacionais necessários para manter o banco de dados distribuído, o que pode implicar em um tempo maior para que o consenso sobre uma operação seja atingido, e para que todos os novos registros sejam gravados em todos os nós da rede.

As redes privadas de blockchain requerem uma permissão para a participação ou um convite. O controle do acesso poderá ser exercido de diversas formas, por exemplo, por uma empresa específica, o criador da rede, um grupo de administradores, os participantes atuais ou uma autoridade pública. Esse tipo de rede oferece grande capacidade de escalabilidade e processamento dos registros.

Bruno Rossi, diretor da consultoria da ASM.

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