A crescente dependência da produção de semicondutores em um mundo cada vez mais digitalizado é inegável. Esses materiais são essenciais para a fabricação de chips e transistores, e sua disponibilidade é fundamental para o funcionamento de diversos setores e ambientes de missão crítica. A pandemia mundial impactou fortemente a produção desses insumos levando a sua escassez que gerou uma crise profunda, principalmente em todo o ecossistema do setor de tecnologia da informação. Mais recentemente a oferta de componentes eletrônicos foi ainda agravada pelas paralisações decorrentes de uma guerra prolongada, sanções comerciais e a chamada "guerra de chips".
Esses eventos têm causado grandes problemas na cadeia de suprimentos, que levaram empresas globais e as brasileiras a adotarem medidas cautelares para garantir a continuidade de suas operações. No entanto, essas ações têm um preço, e os reflexos já podem ser sentidos. Preocupados com a dependência dos países asiáticos, em especial da China, ainda no ano passado, o governo dos Estados Unidos aprovou um investimento de US$ 52,7 bilhões em subsídios, e a União Europeia acaba de aprovar Lei que deverá liberar € 43 bilhões em financiamento para estimular a indústria de semicondutores a desenvolver e produzir na região reduzindo a dependência de importações.
Enquanto os investimentos são feitos para mitigar essa dependência, o mercado atual ainda enfrenta momentos difíceis. O setor de fabricação nacional de nobreaks e estabilizadores, no qual atuamos, sofreu também os impactos da crise e impôs grandes desafios para a indústria manter a segurança da infraestrutura de setores vitais da economia. Agora, como consequência esperamos uma escalada nos preços devido a continuidade da falta de insumos, especialmente diante da evolução da guerra em curso e das incertezas que ela traz.
Exemplificando, um levantamento do mercado de suprimentos de materiais e tecnologias de dispositivos eletrônicos revela que até 54% do néon usado nas fábricas de chips, um componente crítico para os lasers, vem de duas empresas ucranianas: Ingas e Cryoin. Essas empresas têm enfrentado severas interrupções devido à escalada do conflito. Essa disputa geopolítica tem gerado pressões por sanções comerciais levando a uma queda na receita global de semicondutores, com previsão de uma redução de 11,2% em 2023, de acordo com a consultoria Gartner, afetando todo o mundo. Porém, no médio prazo, já contamos que os investimentos realizados e a competição na indústria resultem em um aumento da oferta de componentes. A China, por exemplo, já está preparando um pacote de US$ 143 bilhões para impulsionar sua indústria de semicondutores.
A inexistência de uma fábrica de semicondutores no Brasil e cerca de 80% da produção global estar concentrada no exterior, nos motivou a investir na adoção de ações estratégicas de provisionamento de insumos para produção como forma de auxiliar a enfrentar e vencer o desafio de evitar interrupções. Nossa aposta nessa direção se provou assertiva, tornando-se um fator crucial de estabilidade capaz de garantir um ano de capacidade produtiva e a continuidade de nossas operações. Esse resultado positivo e animador nos leva a acreditar que nossa experiência possa servir de mote para outros players da indústria driblar e sobreviver a essa crise.
Além dos impactos na indústria de TI, que desempenha um papel fundamental na sociedade moderna, impulsionando a inovação e o avanço tecnológico, a crise dos chips também se expande para outros mercados, como a indústria automotiva, deixando o Brasil como um dos países mais caros para a aquisição de eletrônicos. Com a indústria precisando comprar estoques adiantados para garantir a produção, amplia-se esse cenário. As provisões inevitavelmente refletem nos preços finais dos produtos, impulsionando a inflação e distanciando ainda mais os brasileiros da tecnologia.
Como conclusão, vale destacar aqui que diante desse cenário desafiador já se veem esforços conjuntos e colaborativos estratégicos, com ações da indústria e Governos que visam à diversificação da produção e à redução da dependência de fornecedores externos. Investimentos em produção local, parcerias internacionais e incentivos fiscais são algumas saídas que enxergamos para a recuperação desse setor vital na economia global e que se levadas com urgência e seriedade, podem significar um futuro mais estável e próspero.
Pedro Al Shara, CEO da TS Shara.