Esse artigo foi escrito em nossas casas e é bem possível que você também o esteja lendo em sua casa. Com a pandemia da Covid-19, num piscar de olhos, empresas tiveram de se reorganizar às pressas para reestruturar suas operações e o contingente de pessoas trabalhando em home office atingiu números jamais imaginados.
O regime de teletrabalho foi adotado de maneira emergencial para garantir a continuidade das atividades empresariais e preservar a saúde individual e coletiva.
Ainda em 2017, a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) regulamentou o teletrabalho, o que conferiu maior segurança jurídica a empregadores e empregados. Essa forma de trabalho demanda contrato por escrito que preveja essa atuação do trabalhador fora das dependências do empregador e exclui o empregado do regime de controle de jornada. Há obrigações de saúde e segurança do trabalho a serem cumpridas e até mesmo os custos envolvidos na obtenção e manutenção das ferramentas de trabalho remoto devem estar devidamente previstos em contrato.
A Medida Provisória 927/2020, editada para amenizar os efeitos da pandemia, flexibilizou formalidades para a utilização do teletrabalho, o qual pode ser implementado de maneira unilateral pelo empregador, por meio de mera notificação ao trabalhador com curtíssima antecedência, independentemente de acordo individual ou coletivo e sem a necessidade de registro no contrato de trabalho por escrito.
Mas e depois da crise da Covid-19? Protocolos de retorno e reabertura já começam a ser implementados, mas o trabalho à distância se mostrou uma alternativa extremamente viável para empregadores e empregados.
As relações de trabalho serão profundamente alteradas. Questões que antes somente eram resolvidas presencialmente passarão a ser sanadas com um simples clique e uma assinatura eletrônica. Funções serão extintas e outras serão criadas. Será necessário se reinventar para sobreviver à crise ou sair dela ainda mais forte.
Valem a pena os custos de uma estrutura física hiperdimensionada? Empregados preferirão a liberdade e flexibilidade que o teletrabalho lhes permite e preferirão continuar trabalhando remotamente? São necessárias duas estações de trabalho fixas em minha empresa ou um único empregado motivado pela autonomia de exercer suas funções conforme a sua própria agenda conseguirá cumprir com as mesmas obrigações de dois empregados internos?
São diversas as obrigações legais e contratuais a serem cumpridas pelos empregadores para adequar as empresas ao inevitável novo cenário de trabalho no período pós-pandemia, mas as dúvidas e obrigações não passam apenas pelo regramento trabalhista. O fluxo de dados e informações sigilosas que transitarão durante a realização do trabalho remoto faz acender outra luz amarela: a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Há grande incerteza quanto à data da entrada em vigor da LGPD. A Medida Provisória 959/2020, que estabelece o início da vigência em 03/05/2020, foi prorrogada por mais 60 dias — se não for convertida em Lei, a LGPD entrará em vigor em agosto de 2020?
Não é novidade a mania brasileira de deixar tudo para a última hora. A sua empresa está preparada para cumprir com os requisitos da LGPD?
Revisão e elaboração de políticas internas, aditivos contratuais, treinamentos de ergonomia, fornecimento de ferramentas para o teletrabalho serão importantes, mas não suficientes. Como serão tratados os dados aos quais os empregados terão acesso ao realizar o teletrabalho?
Em meio a toda essa turbulência e com todas as dúvidas quanto início da vigência da LGPD, empresas devem adequar suas rotinas, estrutura e práticas às exigências da nova Lei de Proteção de Dados. O mundo não parou e as providências de adequação ao novo regime de proteção de dados tornam-se ainda mais urgentes, principalmente considerando o provável aumento da utilização do teletrabalho.
Os empregados em regime de teletrabalho terão acesso a dados pessoais de clientes, parceiros, empregados e fornecedores. Esses dados transitarão por uma conexão segura e que atende os requisitos da LGPD? Os dados estão armazenados na nuvem ou em um servidor próprio e não certificado? A criptografia foi implementada em conjunto com medidas restritivas que só permitem o acesso por dispositivos devidamente seguros?
Aditivos contratuais, políticas internas e treinamentos deverão prever não só as questões trabalhistas, mas também as obrigações a serem cumpridas pelo trabalhador para resguardar os dados cuja responsabilidade de proteção ficam a cargo do empregador. A melhor prática indica que até mesmo as punições aos empregados que descumprirem tais normas devem estar devidamente previstas nas políticas internas de cada empresa.
Os desafios são muitos e aqueles que se movimentarem antes para adotar as medidas necessárias para a vida empresarial pós-pandemia certamente se posicionarão à frente de seus concorrentes. Sua empresa está preparada?
Bráulio Almeida, advogado da área Trabalhista do ASBZ Advogados e Luiza Sato, sócia da área de Proteção de Dados, Direito Digital e Propriedade Intelectual do ASBZ Advogados.