Secretaria do TCU quer suspender pregões da Anatel

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A controvérsia envolvendo o sistema usado pela Anatel para suas próprias compras e contratações pode trazer consequências à agência reguladora em 2011. A 1ª Secretaria de Controle Externo (Secex) do Tribunal de Contas da União (TCU) quer suspender todos os editais em andamento na agência até que a Anatel se adapte à regra geral que disciplina o uso do pregão eletrônico. A recomendação faz parte de um relatório produzido pela 1ª Secex após a realização de uma auditoria no órgão regulador no ano passado, ao qual este noticiário teve acesso.
Caso o relator do processo no TCU, ministro José Jorge, siga as recomendações da Secex, a suspensão pode ser feita de forma antes mesmo da análise do mérito do caso, em caráter cautelar. A preocupação da secretaria é resguardar o erário público, uma vez que a Secex constatou que o método de compras adotado pela agência não é o mais eficiente para a administração pública. O modelo da agência colocaria em risco o princípio da isonomia na disputa, ao colocar os fornecedores em condições desiguais de participação na licitação, segundo os relatórios técnicos do TCU.
Disputa de cinco anos
As polêmicas envolvendo o sistema próprio de compras utilizado pela Anatel não são novas. Há 10 anos, desde que o governo federal editou uma medida provisória instituindo a modalidade de pregão eletrônico na Administração Pública Federal, o regulamento próprio da Anatel é objeto de acalorado debate nos órgãos de controle e até mesmo na Justiça.
O início do problema está no pioneirismo da Anatel e na sua criação como órgão autônomo e independente para conduzir sua própria gestão. A agência reguladora das telecomunicações foi a primeira a usar o método de pregão, anos antes da medida provisória do governo federal e da transformação da regra em lei pelo Congresso Nacional em 2002. Na verdade, foi o bem sucedido uso da modalidade de licitação pela Anatel que inspirou a criação do pregão eletrônico para toda a administração pública.
Ocorre que, desde que o pregão eletrônico foi plenamente regulamentado por meio do decreto nº 5.450/2005 como a modalidade prioritária de compras do governo central, a Anatel acabou se tornando uma exceção à regra, por manter regras próprias para seus editais. Na prática, o pioneirismo acabou voltando-se contra a própria agência, única hoje a não utilizar a modalidade eletrônica de pregão. Todos os pregões da Anatel ainda são presenciais.
Desde 2005, existem recomendações do próprio TCU e do Ministério das Comunicações para que a Anatel ajuste seu Regulamento de Contratações às regras gerais impostas pelo decreto presidencial, mas a agência nunca adotou a orientação. Em sua defesa, a agência argumenta que a Constituição Federal e a Lei Geral de Telecomunicações (LGT) lhe dão plenos poderes para decidir sobre seu método de compras públicas, não estando sujeita, assim, às regras gerais da administração pública. O TCU não concorda com essa interpretação.
"Insubordinação"
Na argumentação encaminhada pela Anatel ao órgão máximo de controle das contas públicas, a equipe da Anatel chegou a citar que, além da autonomia e da independência típicas da agência, seria objeto de destaque na natureza jurídica da autarquia a "insubordinação", conforme transcrito pela Secex em seu relatório. Em seu posicionamento ao TCU, a Anatel também põem em dúvida a interpretação do termo "União" de forma ampla, abrangendo também as agências reguladoras, sugerindo que as regras impostas à União não atingiriam essas autarquias.
A agência também defende seu método específico de contratação, alegando ser o mais célere entre os existentes no país e argumentando ainda que há evidentes ganhos de economicidade no modelo adotado e de transparência. Para a Secex, contudo, alguns eventuais ganhos obtidos pela agência no modelo específico seriam fruto de um modelo questionável de disputa.
O ponto-chave é o fato de as empresas que participam do edital serem obrigadas a darem lances sem saber se, de fato, estão habilitadas para assinar o contrato no modelo anatelino. Na visão da área técnica do TCU, esse modelo seria "imoral". "A redução de custos é um dos objetivos que deve nortear a atuação da Administração, mas a mesma não deve usar nenhum tipo de artifício, no mínimo, imoral, para tanto", afirmam os técnicos da Secex. A forte acusação feita pela secretaria se baseia na constatação de que o método da Anatel não privilegiaria a justa competição entre os participantes, ao eliminar a chance de diversos concorrentes pelo simples fato de eles não saberem se estão classificados ou não.
Caso ainda será julgado
Além da recomendação de que os pregões andamento sejam suspensos imediatamente, a 1ª Secex pede que a Anatel entregue um levantamento detalhado de todas as disputas realizadas desde 2007 para calcular o montante financeiro envolvido nas contratações feitas pela agência. Por enquanto, o TCU possui apenas um valor aproximado das disputas em aberto, que totalizariam R$ 76,5 milhões.
Como a Secex sugere uma medida drástica até que a Anatel revise suas regras de compras, o ministro-relator resolveu ouvir primeiro as autoridades da agência sobre a viabilidade de suspender os pregões sem prejuízo à autarquia. Segundo apurou este noticiário, os conselheiros da agência já teriam apresentado suas considerações ao Tribunal de Contas, mas ainda não há previsão de quando as recomendações da secretaria serão analisadas, já que o TCU está em recesso no momento.
Apurações
A secretaria também recomendou ao ministro-relator que investigue as circunstâncias em que o Conselho Diretor da Anatel decidiu manter seu regulamento sem alterações mesmo após uma sequência de recomendações para que a agência adéqua-se seu método de compras. A agência decidiu no ano passado convalidar o regulamento em vigor até que seja concluída a análise de um processo interno de criação de regras próprias para adoção do pregão eletrônico. As recomendações de que a agência atualizasse imediatamente o seu método de compras partiram do Supremo Tribunal Federal (STF) e da Advocacia-Geral da União (AGU). Mas a própria decisão do STF é motivo de controvérsia, já que a Anatel entende que o supremo tribunal validou o seu regulamento próprio. O TCU, a AGU e a procuradoria da Anatel interpretam de forma oposta. Entendem que o STF determinou que a Anatel siga a regra geral, quando houver.
A Secex quer que os responsáveis pela Superintendência Executiva (SUE) e pela Superintendência de Administração Geral (SAD) da Anatel esclareçam ao tribunal porque instruíram o Conselho Diretor da agência a interpretar a decisão do STF de forma contrária ao entendimento dos órgãos de controle. Os conselheiros que votaram a favor da manutenção do regulamento próprio também devem ser ouvidos pelo tribunal caso as recomendações da Secex sejam aceitas pelo ministro José Jorge.
Brigas internas
As polêmicas em torno do método de compras da Anatel tornaram-se públicas especialmente depois de uma briga interna na própria agência. O conflito ocorreu entre o responsável pela SAD, Rodrigo Barbosa, e procuradores da Anatel por conta de uma revisão do parecer jurídico em vigor que validava o regulamento da agência. A segunda versão levou em consideração a decisão do STF, interpretando o julgamento como uma exigência para que a Anatel atualizasse suas regras ao decreto do pregão eletrônico.
O bate-boca acabou gerando duas representações na AGU, uma dos procuradores contra Barbosa e outra de Barbosa contra os procuradores. O primeiro posicionamento da AGU foi favorável aos procuradores ao corroborar com a nova interpretação dada pela área jurídica, recomendando que a Anatel ajuste o regulamento o quanto antes. A presidência da Anatel pediu que a AGU revisse seu posicionamento, mas até o momento não foi emitida nova recomendação à Anatel.

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