Sorria, você está sendo vigiado (por enquanto)

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Imagine as seguintes situações: sábado de sol, você vai ao shopping com sua família e, logo na entrada, um segurança pede seu nome, telefone e CPF para que vocês tenham acesso irrestrito ao local. Família se divertindo, mas, ao entrar nas lojas, você é carimbado sem explicação ou permissão. A caminho de casa, você para no supermercado e o segurança, sem sua autorização, pega sua carteira com todos os seus documentos. Mesmo assim, e apesar dos vendedores no meio dos corredores, insistentemente oferecendo artigos relacionados a um lado pessoal, íntimo, que não tinha sido contado para ninguém, você segue para as compras.

Queiramos ou não, esses absurdos acontecem na internet há muito tempo. Como usuários, demoramos para percebê-los e as autoridades ainda mais para atuarem contra eles – exemplo disso é que a falta de regulamentação e falhas na fiscalização levaram a escândalos de ordem global e a vazamentos de todos os tamanhos de informações pessoais nas últimas décadas.

Quem não se lembra do emblemático caso Cambridge Analytica e Facebook, hoje Meta, em que uma enorme quantidade de dados foi cruzada e usada para manipular a opinião pública durante as eleições presidenciais dos Estados Unidos? E se eu disser que há uma enorme probabilidade dos seus dados estarem disponíveis na deep web? Não acredita? Procure ferramentas online como Have I Been Pwned? e Avast Hack Check. Eu fiz o teste e já estive em mais de 15 vazamentos de sites que eu sequer lembrava ter compartilhado minhas informações pessoais.

Felizmente, para um problema desse tamanho, houve e há grandes movimentações impulsionando avanços regulatórios como o GDPR – General Data Protection Regulation, na Europa; o CCPA – California Consumer Privacy Act, nos Estados Unidos; e, no Brasil, a LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados.

Foi, a partir deste movimento, que há algum tempo você vem sendo convidado pelos sites a conscientemente permitir o uso de (first-party) cookies para diferentes objetivos ou, no mínimo, é apresentado à opção de continuar navegando via aceite tácito de que eles serão usados para fins diversos. Que fins são esses? Teríamos que ler os termos de uso e privacidade antes do scroll down até o botão de aceite. Um dia chegaremos lá, tenho fé.

Já que falei em movimento, a essa altura do campeonato, a Apple já atualizou seus sistemas operacionais, o que impôs restrições aos identificadores mobile e provocou impactos significativos para a estratégia das marcas nestes ambientes. Outra mudança radical está finalmente em curso: a extinção definitiva, em 2024 do suporte a cookies de terceiros pelo Chrome – a exclusão foi iniciada para 1% de todos os usuários do navegador ainda em janeiro e, até o final do terceiro trimestre, testemunharemos a supressão dos third-party cookies em 100% da base. Na prática, o acesso à informação das pessoas diminuirá consideravelmente.

Pessoalmente, na física e na jurídica, vejo o copo transbordando de tão cheio, mesmo considerando que, em publicidade, informação é base para segmentação, que é caminho para personalização, que por sua vez potencializa a atração de usuários e conspira para a geração de receita para os anunciantes.

O fato é que a evolução na forma como nossos dados são coletados, tratados e protegidos não altera o objetivo essencial do ecossistema publicitário de alavancar marcas. O que mudou foi a premissa: se o uso de dados servia exclusivamente aos legítimos interesses do usuário, hoje, esse objetivo não se sobrepõe ao interesse do consumidor em preservar sua privacidade. Mais ainda, em escolher quais dados compartilhar, por quanto tempo e a contar com penalidades às empresas em casos de desrespeito dessas decisões individuais.

A largada foi dada há muito tempo e quem já desenvolveu e estruturou novas alternativas está na dianteira estratégica e competitiva nesse cenário cookieless. Entre as opções de segmentação que oferecem altos níveis de personalização e respeitam a privacidade dos usuários, destaco:

– Segmentação contextual: plataforma que execute leituras semânticas dos conteúdos e entregue conteúdo personalizado de maneira não invasiva;

– Audiências preditivas: dados anônimos de navegação do usuário continuarão disponíveis em um ambiente cookieless. Há plataformas que aplicam inteligência artificial a um set gigante de dados para encontrar clusters tão ou mais efetivos que os cookie-based;

– Topics API (Privacy Sandbox): iniciativa do Chrome para substituição de third-party cookies que visa centralizar informações pessoais dos usuários no navegador e restringir o acesso das plataformas sobre o usuário;

– Unique IDs (logins): com maior dificuldade de aderência por parte dos usuários, os logins oferecem uma solução que funciona em um ambiente cookieless e possui bom poder de granularidade por usuário, mas depende de informações pessoais.

Há um processo e um chamamento a mais consciência, responsabilidade e ação do mercado publicitário para o uso inteligente e respeitoso de dados primários. Como profissional da área, vejo muitas oportunidades para a troca de ideias, de experiências, para o estabelecimento de novas parcerias. Como usuário, quero crer que o número de 15 vazamentos não vai virar 16, 17, 18… Meus dados e minha paz de espírito agradecem.

Wilker Leal, Data Business Lead da Teads no Brasil.

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