Brasil precisa ser protagonista no tabuleiro global da IA

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Quem está vivo hoje testemunha um momento raro na história da humanidade. A inteligência artificial toma o centro do palco como a possível propulsora de uma nova era, concordam os especialistas. 

Há quem classifique a IA como a nova internet e até a nova eletricidade. Outros consideram que a vastidão das aplicações da IA, em todos os campos e indústrias, criará um ciclo de disrupção sem precedentes, com implicações sociais, políticas e econômicas tão marcantes que resultarão em um novo Renascimento. 

Neste contexto, a IA Generativa se compararia à prensa de Gutenberg, que mudou completamente a forma de disseminar ideias científicas, artísticas e religiosas.

Não temos bola de cristal, mas dados nos habilitam a fazer projeções e, sem sombra de dúvida, o caráter democrático e escalável da IA pode impulsionar um futuro de incalculáveis transformações.

O desafio é compreendê-la e posicioná-la em papéis decisivos para alavancar resultados e solucionar problemas, incluindo até questões mais complexas da nossa espécie. Talvez, a tecnologia seja a chave para nos livrar do apocalipse climático ou, sob a perspectiva da ficção sobre futuros distópicos, possa nos jogar em um confronto homem-máquina.

Sou otimista e acredito que saberemos nos beneficiar com seus infinitos recursos. O brasileiro em geral, aliás, demonstra uma atitude confiante diante do que a tecnologia pode nos render, assim como aderiu logo à internet.

Segundo um estudo da Getty Images feito em 25 países com mais de 7 mil adultos, 4 entre 6 brasileiros acreditam que a IA pode trazer impacto positivo em suas vidas. Essa estimativa está acima da média global, em que só 5 de cada 10 consultados concordam com a afirmação. Esse otimismo brasileiro é justificado pela crença na capacidade da IA de potencializar a produtividade.

Aceleração na indústria

O alvoroço global em torno do ChatGPT resultou em uma corrida da indústria nos quatro cantos do mundo para aprimorar processos e, assim, preparar o terreno para a adoção da IA.

No Brasil, as empresas vão precisar dar passos mais largos na direção da digitalização e automação como forma de estruturar uma base sólida na qual a IA possa ser implementada e ter todo o seu potencial explorado.

A adoção de inteligência artificial pela indústria brasileira mais que dobrou no último ano, saindo de 4% em 2021 para 9% em 2022, de acordo com informações do "Índice de Automação do Mercado Brasileiro", realizada pela Associação Brasileira de Automação-GS1 Brasil. O salto é interessante, mas o ritmo ainda é considerado moroso ao julgarmos a capacidade do setor.

Falhas na gestão de dados das companhias, a dificuldade de identificar possíveis aplicações para a tecnologia e projetar os ganhos de eficiência colaboram para intrincar a tomada de decisão pelos líderes. São fatores que explicam essa lentidão.

A transformação e o amadurecimento digital das corporações nunca foram tão urgentes, com as discussões ganhando amplitude para fora dos departamentos de tecnologia e indo parar nas agendas dos CEOs.

A pesquisa mais atual da EY "CEO Outlook", publicada em outubro deste ano, confirma o movimento, com a grande maioria dos CEOs (99%) debruçados sobre planos de investir em IA.

Quando se faz um recorte na GenIA, 70% reconhecem que suas organizações devem agir agora na direção da inteligência artificial generativa para evitar dar vantagem estratégica aos concorrentes. Ao mesmo tempo, no entanto, quase a mesma quantidade (68%) concorda que a incerteza em torno dela torna desafiador avançar rapidamente no desenvolvimento e implementação de uma estratégia de IA.

Segundo o estudo, um aumento no número de empresas buscando expertise em IA vem dificultando a tomada de decisão sobre possíveis parcerias e aquisições que, de fato, agreguem valor.

Juntamente aos complexos cenários geopolítico e econômico, este efeito teria contribuído para a queda no apetite por aquisições, que teve seu nível mais baixo desde 2014, com apenas 35% dos CEOs planejando M&As para os próximos 12 meses. Na cena brasileira, 34% dos CEOs priorizam fusões e aquisições. A modalidade é seguida por reserva de caixa para oportunidades futuras, com 30%, ligeiramente superior à média global, de 29%.

Startups

Enquanto isso, no topo do mundo, as gigantes globais mostram todo o seu apetite para ultrapassar a concorrência na adoção de inteligência artificial generativa.

Este ano, foi o caso da Databricks, que pagou US$ 1,3 bilhão pela MosaicML, startup que constrói ou redefine modelos de LLM para empresas usando dados da casa.

Vimos também a Thomson Reuters adquirir a Casetext por US$ 650 milhões, startup conhecida por ter criado a primeira assistente jurídica alimentada por IA do mundo.

As big techs continuam movimentando seus peões no tabuleiro. Microsoft, Google e Amazon investiram quase US$ 20 bilhões só na OpenAI e na Anthropic, sendo que bem mais da metade desse total apenas em 2023.

Um relatório recente da empresa de risco Accel aponta que o ecossistema de empresas de GenIA é o novo celeiro de unicórnios. Do total de novas startups avaliadas em US$ 1 bilhão, 60% fazem inteligência artificial generativa.

Uma delas foi criada por um brasileiro. Formado em engenharia de computação na USP, Daniel Freitas fundou a Character.AI ao lado do também engenheiro Noam Shaazer. A startup desenvolve chatbots que permite aos usuários conversar com personagens famosos reais e de ficção.

Fundada em Menlo Park, na Califórnia, a Character.AI tem alguns meses de vida e sua plataforma no momento está em versão beta, mas já garantiu o seu selo de unicórnio e, segundo a imprensa, pode ver seu valuation saltar até US$ 10 bilhões – no cenário mais positivo – em negociações que estariam em curso.

Ex-Google e ex-Microsoft, Daniel já figura até na lista de novos bilionários brasileiros, segundo a Forbes.

Panorama nacional

O Brasil tem um conhecido ambiente robusto de startups e total capacidade de gerar seus próprios unicórnios de IA. Sabemos que, de todos os 45 unicórnios da América Latina, mais da metade fica em nosso território.

A questão, porém, vai muito além. Queremos ver startups nacionais de IA solucionarem cada vez mais problemas reais dos brasileiros. E, por que não, do mundo.

Um levantamento recente da Distrito mapeou 504 startups brasileiras de tecnologias emergentes e, desse total, 111 foram identificadas como de inteligência artificial, representando a maioria entre as categorias catalogadas.

É um sinal de que os founders estão superando as adversidades para inovar na área e os investidores apostando que o Brasil pode ser um dos produtores centrais de IA na América Latina e no mundo.

Ricardo Gazoli, professor de Transformação Digital, conselheiro, mentor e investidor de startups e cofundador da AlumniTech.

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