Dez falhas mais comuns dos empreendedores de TI

0

A história da maioria dos empreendedores de TI se inicia com a união de dois ou mais sócios que, ao trabalharem em uma empresa, departamento ou consultoria de tecnologia, decidem que, juntos, podem empreender em um negócio próprio. Nasce então uma nova organização, com sócios que geralmente detém grande conhecimento técnico e constroem ferramentas/soluções consideradas milagrosas aos clientes, o que eleva a autoestima dos novos empreendedores e reforça o lema na área de TI de que "Deus criou o mundo,  nós criamos a tecnologia que move o mundo".

Ocorre que as áreas de back office, sejam elas administrativa, financeira, contábil, fiscal e jurídica, geralmente são postas em segundo plano, elevando a área técnica e comercial como as prioridades de qualquer micro e pequeno empreendedor. Neste momento nasce também dez das principais falhas dos empreendedores de TI, as quais levam muitas empresas a enfrentar problemas jurídicos bastante graves. São elas:

1 — Parcerias em TI e propriedade da tecnologia – no geral o custo de manter uma estrutura para a criação de um software, hardware ou firmware, é extremamente elevado, e nem sempre está ao alcance de todos, e dessa forma, são feitas parcerias em TI para viabilizar o projeto, porém na maioria das vezes os contratos de parcerias deixam de proteger adequadamente os direitos autorais de software ou de propriedade industrial.

Há casos em que empreendedores mais preocupados com esses contratos buscam grandes bancas de advocacia, que por falta de conhecimento do segmento deixam brechas que podem prejudicar muito, levando ao infortúnio da quebra contratual, jogos de poder, sabotagem, apropriação indevida do código-fonte, contrafação, entre outros crimes eletrônicos.

2 — Contrato com clientes e penalidades – da mesma forma que ocorre com os contratos de parceria, há muitas empresas de TI que o responsável pelo contrato de prestação de serviços de tecnologia é um dos sócios que segundo a sua experiência de vida já entende bem do assunto, pegando a base em modelos na internet, ou de concorrentes e clientes.

Ocorre que todos os dias há milhares de julgados em todo o país discutindo questões envolvendo a responsabilidade civil, fiscal, tributária, trabalhista etc., alterando significativamente a jurisprudência, e certamente sendo obrigatório o resguardo de alguns direitos no contrato;

3 — Gestão administrativa e financeira – É muito comum na área de TI, fixar preços de acordo com o famoso "padrão de mercado", deixando de observar na proposta comercial, as horas que serão gastas no projeto (desenvolvimento), na implantação, configuração, instalação e na manutenção dos sistemas, bem como os custos fixos, variáveis e margem de rentabilidade, o que tem criado distorções imperdoáveis em termos de resultado financeiro, ou seja, faturamento alto, mas sem lucro.

Nesse sentido, as demonstrações financeiras, tais como balanço, balancetes, demonstrativo de resultado — DRE, demonstrativo de fluxo de caixa —, DFC e orçamento, podem ser instrumentos muito úteis na tomada de decisões e para a elaboração de um planejamento estratégico consistente.

4 — Riscos empresariais — Com uma vasta experiência em consultoria jurídica para as empresas de TI percebe-se que quanto mais os sócios acreditam que a sua empresa está isenta de riscos, maior a probabilidade de haver alto índice de contingências de todas as ordens.

Geralmente, essas empresas acreditam que por ter uma contabilidade que há muitos anos (antiguidade) presta assessoria e nunca teve problema, ou ainda por ser de grande porte (muitos funcionários e atendem grandes empresas), ou ainda mais por ser auditada pelas grandes consultorias (Big Four), estão livres de qualquer risco e se sentem seguras.

Entretanto, os critérios de antiguidade e de grandeza das empresas contratadas pouco podem contribuir hoje com a dinâmica dos negócios, a velocidade da legislação e da jurisprudência, e da alta tecnologia dos órgãos públicos no cruzamento de informações.

5 — Declarações fiscais, certificado digital e home banking – Atualmente, o Fisco exige das empresas no geral a entrega de diversas declarações eletrônicas DCTF, DACON, DIPJ, DIRF, GFIP, Sped Contábil e Fiscal, DES etc., e para isso muitos contabilistas em vez de solicitar a outorga de uma procuração eletrônica, solicitam a entrega do certificado digital com a senha para fazer as entregas de declarações fiscais.

O certificado digital é uma assinatura eletrônica, e ao passar a senha, seria o mesmo que assinar "um cheque em branco", em que pese a elevada confiança que o empreendedor tem em seu contabilista, geralmente isto fica ao encargo de seus funcionários e colaboradores, e muitas empresas desconhecem que atualmente os home bankings permitem acesso com esse mesmo certificado e consequentemente até transferências financeiras, o que pode gerar um grande risco para a empresa.

Sem contar que as referidas declarações geralmente são entregues sem a conferência dessas informações pela área financeira ou pelos sócios, o que pode gerar futuramente riscos de autuação,  ou seja, não basta fazer o certo, deve-se declarar certo.

6 — Planejamento tributário e o Simples Nacional — A maioria dos empreendedores de TI acreditam que pelo fato de ter enquadrado no Simples Nacional suas empresas, geralmente em nome do pai, da mãe, do filho, da tia etc., está pagando a menor carga tributária. Entretanto, dependendo da estrutura de custos, mesmo sendo uma micro, pequena ou média empresa, a contribuição ao Simples Nacional, torna-se a maior carga tributária.

Tanto o governo como os contabilistas e até os financeiros das empresas também preferem o Simples Nacional, pois dá menos trabalho, não precisa entender a complexidade da apuração dos demais regimes, e todo mundo sai ganhando, mas  é comum concluir que os sócios é que pagam mais por essa "facilidade".

7 — Finanças Empresariais x Pessoais — É muito comum principalmente nas empresas do Simples Nacional ou no Lucro Presumido, inexistir qualquer preocupação da contabilidade e dos empreendedores quanto aos pagamentos de contas pessoais pela conta da empresa, pois não se leva a sério a escrituração contábil das demonstrações financeiras, o que prejudica não só a análise gerencial e estratégica já mencionada no item 3 acima, mas pode ser interpretado pelo INSS como forma de remuneração indireta de diretoria, e consequentemente como pró-labore, sujeita a 20% de contribuição, mais Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF), pela tabela progressiva de até 27,5%.

8 — Contrato Social — Geralmente o contrato social é visto pelos sócios como um modelo padrão que a contabilidade deve cuidar, e que por ter contatos na Junta Comercial entendem de todos os detalhes e tudo é registrado rapidamente, mas há várias cláusulas que podem trazer sérias implicações tanto em termos de responsabilidade perante terceiros, como de direitos e obrigações dos sócios e herdeiros.

9 — Defesa em autos de infração — É muito comum que as empresas de TI com o receio de gastar com honorários advocatícios solicitem que o contabilista formado em Direito elabore sua defesa administrativa em auto de infração aplicado pelo Fisco, por entender que esse profissional conhece bem sua empresa e todos os detalhes de sua operação, e certamente obterá um resultado favorável.

Entretanto, tanto os Tribunais de Impostos e Taxas (TIT), Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), Conselho Municipal de Tributos (CMT), entre outros órgãos, estão cada vez mais especializados exigindo dos profissionais que defendem as empresas em um nível de conhecimento mais apurado na defesa dos direitos e certamente podem afetar em futura defesa judicial.

Em função da complexidade e inovação constante na área de tecnologia, é importante também o conhecimento do advogado de todos os detalhes e especialidades em software, hardware, firmware, e-commerce, cloud computing, telecom etc., para que as defesas possam expressar adequadamente a definição dos fatos jurídicos tributários e todos os aspectos da regra matriz de incidência.

10 — Subcontratação – O mercado de TI vem sofrendo com a carência cada vez maior de profissionais, cogitando alguns um verdadeiro apagão de mão de obra, e nesse sentido, os profissionais melhor qualificados são disputados a peso de ouro, sendo oferecidas remunerações consideráveis.

Entretanto, muitas vezes se deixa o risco trabalhista, previdenciário, fundiário e tributário de lado na subcontratação, o que pode acarretar não só problemas futuros de uma reclamação trabalhista milionária, como em caso de oferta de aquisição por um investidor ou empresa concorrente, ser apontada essa contingência para ser descontada do "valuation" da empresa, prejudicando na negociação do preço, e assim afetando diretamente o bolso dos sócios.

*André Sussumu Iizuka  é sócio da Iizuka Advocacia, especialista no segmento de tecnologia da informação e telecomunicações. Conselheiro da Associação Brasileira de Software (Abes) e pesquisador do Grupo de Estudos de Tributação Internacional (GETI-NEF), do Núcleo de Estudos Fiscais da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas – NEF/DireitoGV. Ele tem especialização em Direito Tributário pela FGV-SP e em Direito Empresarial pela PUC-SP/COGEAE,  além de sócio-fundador e membro do Conselho Fiscal do Instituto de Tecnologia de São Caetano do Sul – ITESCS.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

This site is protected by reCAPTCHA and the Google Privacy Policy and Terms of Service apply.