Para alguns observadores internacionais, a decisão da Grã Bretanha de deixar a União Europeia (UE), conhecida como "Brexit", fusão dos termos "british" e "exit" — que significam saída britânica em inglês —, terá vários impactos sobre os grandes fornecedores de serviços em nuvem, que já preveem turbulências pela frente. O primeiro reflexo será uma freada brusca na expansão de data centers pelas empresas estrangeiras no Reino Unido, particularmente, as norte-americanas. Outro impacto será de cunho financeiro, já que a tendência de aumento dos custos operacionais deve afetar a receita de muitas empresas de tecnologia.
Os observados acreditam, aliás, que a Brexit será um tema recorrente em todas as teleconferências de resultados das empresas nas próximas semanas, até porque há alguns problemas de logística de tecnologia reais que terão de ser resolvidos. Diante disso, o site ZDNet traçou alguns cenários sobre como a saída da Grã Bretanha da UE irá impactar os provedores de nuvem de grande porte, tais como a Amazon Web Services (AWS), Microsoft Azure, Google Cloud Platform e IBM.
Analistas ouvidos pelo site avaliam ser altamente provável que os planos de construção de data centers pelos fornecedores de nuvem americanos no Reino Unido sejam protelados. A AWS e a Microsoft Azure têm instalações na Irlanda. O Azure também tem uma unidade em Amsterdã e havia anuncido planos de construir dois data centers no Reino Unido. Agora, com a possibilidade de novas regulamentações, que devem adicionar custos aos fornecedores de nuvem, muitos estão propensos a aumentar suas operações na Irlanda, que faz parte da União Europeia, e se expandir na Alemanha.
É provável que a Irlanda se torne o barco salva-vidas para os provedores de nuvem que desistirem do Reino Unido. De imediato, a Brexit faz da Irlanda um país melhor para operações de serviços financeiros e de tecnologia. A Irlanda também pode se tornar o centro de operações de nuvem da Europa Ocidental.
A UE tem feito um grande esforço para criar um mercado único digital, que ofereça padrões de infraestrutura, bem como simplifique o "ecossistema" para se tornar um polo em inovação. As novas normas de TI que devem ser estabelecidas no Reino Unido inevitavelmente irão na contramão do mercado único digital. Mas ainda é prematura falar sobre qualquer diretriz.
Relatórios após a saída do Reino Unido da UE indicam que a Escócia está pensando em deixar o país e que outros países do bloco econômico planejam realizar plebiscitos como o mesmo propósito — ficar ou sair. É muito cedo para prever também que a UE irá se dissolver, mas as implicações para os provedores de nuvem, se isso ocorrer, seriam enormes. O mais provável, porém, que outros países aguardem para ver o que acontecerá com o Reino Unido antes de realizar um referendo.
De qualquer modo, se a UE desaparecer, cada país terá seu próprio regulamento, com base no tamanho e importância do mercado. Também não está claro como os dados fluíriam entre os países. Uma desintegração da UE enfraqueceria a computação em grid e os acordos entre os países. O que poderia surgir é uma série de provedores de nuvem específicos em cada país, em vez dos quatro grandes players atuais, como a AWS, Azure, Google Cloud Platform e IBM.
Cenário incerto
O fato é que se o Reino Unido realizar uma sáida rápida da União Europeia, como querem Alemanha e França, os cenários acima mencionados tendem a ser contidos. No entanto, se as negociações se arrastarem alguns provedores de nuvem tendem a analisar a possibilidade de instalar seus data centers em outras regiões. Em outras palavras, a infraestrutura de nuvem existente na Europa pode, sim, ser transferida para a Ásia até que as incertezas sejam diluídas.
Pressumindo que a Irlanda do Norte e a Escócia não deixem o Reino Unido, há a possibilidade de que mais data centers sejam construídos no país. Mas, para isso, ele terá de deixar claro qual será o modelo de privacidade a ser implantado. Há a especulação de que o Reino Unido poderia tornar os negócios para as empresas de tecnologia mais amigáveis.
Para a analista da Forrester na República Tcheca, Laura Koetzle, a privacidade e o armazenamento de dados terão implicações profundas com a Brexit. "Para uma saída do Reino Unido da UE bem-sucedida ele que terá de: a) se tornar uma entidade de confiança, como o Canadá ou a Suíça; ou b) aprovar novas leis sobre privacidade que atendam aos requisitos do Regulamento Geral sobre Protecção de Dados (PIBR, na sigla em inglês) da UE, pois do contrário as empresas que operaremm no Reino Unido terão de repatriar dados para data centers instalados no bloco." Além disso, segundo ela, as empresas da UE agora vão exigir que seus fornecedores de nuvem migrem seus dados para fora do Reino Unido, para data centers instalados na UE, justamente para cumprir o PIBR.
Outro aspecto a ser observado com a saída da UE do Reino Unido é que é altamente provável que os clientes terão de cumprir um conjunto de regras envolvendo a soberania de dados — um no Reino Unido e outro, na UE. Os órgãos reguladores do Reino Unido sabem que a estabilidade financeira depende também da mantutenção desses provedores de infraestrutura no país e da capacidade de trazer mais empresas.
Para analistas, o país pode, sim, se tornar uma Meca da inovação tecnológica — um lugar onde as empresas vão experimentar, inovar e criar — e um centro onde ela (a inovação) não será sufocada por regulamentos como da UE. O problema é que questões como privacidade e normas envolvendo dados podem consumir meses de negociações. E, antes disso, o Reino Unido terá de começar a negociar sua saída da UE, o que poderá levar até dois anos. E dois anos é muito tempo para qualquer operação de nuvem.